4 de setembro de 2009

A FLOR TRISTE E A BORBOLETA AZUL

Postado por Agnaldo Vergara
Texto publicado no Livro Quatro Bruxas no Elevador, editora Scortecci, 2002

Vou pedir ao meu filho Giulio e à namorada Patrícia – a ambos! – que me deixem partilhar com o leitor um de nossos segredos.
É que deles dois eu ganhei um livro de presente no meu aniversário, com a seguinte e... ultraocupacional dedicatória:
Mama escritora: que você possa a cada novo aniversário comemorar, também, a publicação de um novo livro seu.
10 (elevado à potência 88) abraços e 10 (elevado à potência 99) beijos.
O leitor sabe o que significa, eu ter que escrever, daqui para a frente... um livro a... cada ano?
O leitor sabe quantos abraços são 10 elevado à octagésima oitava potência de abraços e 10 elevado à nonagésima nona potência de beijos?
Eu também não. Só sei que a conta se faz assim! 10 x 10 x 10 x 10 x 10... por 88 vezes.
Cruzes! Não vou saber ler um tal número de abraços e mais ainda de beijos. Mas entendo que a minha tarefa seja abraçar e beijar pelo resto desta minha vida e, provavelmente, por algumas futuras encarnações. Neste exato instante, caro leitor, eu estou abraçando você, homem e beijando você, mulher. Coisa boa! E minha nova amiga, a artista Erenita!
Os jovens são encantadores pelo exagero. Convenhamos... tudo muito comedido não só é chato como... monótono mesmo.
Um livro traz um elo, uma ligação entre o autor e o leitor. Quando se presenteia com um livro, o que se está fazendo, na verdade, é tomar emprestado o texto daquela obra, para, em seu próprio nome, estabelecer um ele com o presenteado.
O segredo que dele nasce pode ser um exemplo a seguir-se e que o livro sugere; pode ser um aviso; uma admoestação; uma advertência; uma correção a ser feita; um desejo que assim fosse... o que assim não é, ou um desejo que fosse assim o que assim não é. Pode significar uma beleza a ser compartilhada; um... perigo a ser repelido, uma evocação... um transporte afetivo! Tudo isso entre o doador e o presenteado.
Via autor.
Curiosa. Pois, bem depressa fui ler “O Alquimista", de Paulo Coelho.
A idéia-mensagem que restou em minha mente, depois de espremido tudo o que se podia espremer; depois de dispensado tudo o que se podia dispensar; depois de esquecido tudo o que se podia esquecer, foi esta:
Um pastor de ovelhas recebeu de um sábio a revelação de um segredo: em um dado local, nas Pirâmides do Egito, havia um tesouro a espera dele.
Contudo, o pastor de ovelhas deveria aprender pelo caminho a ler os sinais do presente, para melhorar o futuro, modificando-o e seguir em busca, sempre à frente, de sua... “Lenda Pessoal”. Isto é, a realização de seus desígnios, demorasse quanto demorasse.
Ninguém que ama verdadeiramente sofre com a demora do ser amado que estava... buscando sua Lenda Pessoal; o amor puro nunca impede, pois, a alguém, de buscar o próprio destino.
Ao contrário ! O amor ajuda o Universo que INTEIRINHO, conspira a favor da pessoa que, intensamente, quer falar a Linguagem do Mundo, caminha para integrar-se com a... Alma do Mundo... DE ONDE SAIU E PARA ONDE VAI VOLTAR !
Isto É a felicidade! E a vida só é generosa para quem vive sua Lenda Pessoal. Para quem faz... o QUE DEVE SER FEITO.
A... infelicidade é o caminhar fora dela e nunca ver o mundo como se fosse pela... primeira vez! Fora de sua Lenda. os sinais vão se perdendo, a identidade diluindo... até que só reste a saudade de ser aquilo que... poderia ter sido.
Conhecer, pois, sua Lenda Pessoal é a chave da felicidade.
– EU Aposto!!... eu aposto como a Borboleta Azul leu esse livro ! Exclama o Bud entusiasmado.
– Borboleta Azul ?! Pergunto eu, espantada. Conte-nos a história, vai... “queridíssimo” Bud.
– Não é história. É a verdade – retruca ele, um tanto... cremoso com o desusado “queridíssimo”, que é o grau superlativo absoluto sintético do adjetivo “querido”.
– Conte-nos, então. Essa... verdade !
E ele, sem mais delongas, foi explicando:
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“...chamou-me a atenção a Borboleta Azul a conversar com a Flor Triste.
A Flor triste morava num canteiro de flores da Casa Triste.
O Pai Triste.
A Mãe Triste.
Os Filhos Tristes.
A Flor Triste não emprestava perfume, perfumando; não esparzia sementes, semeando. Ela... plantava lágrimas... magoando !
Assim estava, quando por ali Passou a Borboleta Azul, que entendia e falava a Linguagem do Mundo e resolveu fazer o quê Deveria Ser feito.
Contou para a Borboleta Triste: "Conheço um lugar bem distante e, ao mesmo tempo, bem próximo!
Não há chaves para entrar ali. Porque... não há fechaduras! E não há fechaduras porque também não existem portas...
Para entrar você se despe antes, de todos os Pensamentos já pensados. A Inteligência fica limpa, então!
E despe-se de todos os Sentimentos já sentidos.
O Coração assim fica leve!
Aí já pode entrar.
Você entra e observa o Mundo... como se fosse... PELA PRIMEIRA VEZ !
Venha comigo, Flor Triste. Venha penetrar na Alma do Mundo! De onde se vem... para onde se vai!
Levada pela Borboleta Azul, a Florzinha Triste resolveu penetrar na Alma do Mundo e aprender uma linguagem diferente.
Começou por onde se começa! A fazer o quê Deve Ser Feito.
Primeiro livrou-se de todos os Pensamentos já pensados...
E limpou a Inteligência!
Depois despiu-se de todos os Sentimentos já sentidos.
E aliviou o Coração!
Colocou a chave que não existe, naquela porta que não havia!...
E viu o Mundo, como se fosse pela Primeira Vez!
Como era simples!
A coisa mais simples do mundo!
– O que você está vendo – disse-lhe a Borboleta Azul – é justamente o quê você Deve Ver!
A Florzinha foi então vendo o que Deveria Ver e notou que todos ali estavam fazendo o quê Deveria Ser Feito.
Com seus olhos de flor, enxergou a... Família do Vento.
Havia o Vento Pai.
O Vento Mãe.
Os Ventos Filhos.
Você pode não acreditar, mas todos eles... ventavam!
A Flor notou primeiro, talvez porque fossem tantos, os...Ventinhos.
Cada um recebia da Mãe Vento uma cestinha transbordante de sementes de todos tipos.
-Vai, meu Filho, semear pelos caminhos! – dizia ela – a cada um.
Eles entendiam a Linguagem e partiam.
O dia inteiro a Mãe Vento fazia isso. Era o que Devia Ser Feito.
Depois a Flor notou o Pai Vento.
Ele estava muito ocupado, fazendo que Devia Ser Feito; recolhia todo o vapor do Ar Quente que encontrava e, segurando-os com carinho, para que não se resfriassem, levava-os para o Espaço.
Quando o Pai Vento chegava bem longe, que para nós parece “lá em cima” bem no alto, ele encontrava o ar frio. Então nascia a Nuvem.
A Nuvem fazia o que Devia Ser Feito.
A Nuvem... chovia!!
As gotinhas da Chuva iam caindo e caindo, lá das “alturas”, umas maiores, outras menores; algumas corajosas, outras tímidas; desciam todas... com a mesma velocidade!
Nunca nenhuma delas, por pequenina que fosse, perdeu-se pelo caminho, porque a Terra cantava e seu canto as atraia para fazer... o que Devia Ser Feito: emprestar-lhe a umidade.
Aquecida e úmida, a Terra abraçava as sementinhas que os Ventos Filhos esparziam.
A sementinha, assim acarinhada, explodia no Milagre que acontece todos os dias, como se fosse pela Primeira Vez...
A Sementinha brotava!
Era o que devia Ser Feito.
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A Borboleta logo notou que a Flor, antes muito séria, abriu-se num sorriso iluminado por todas as cores e falou:
– Encontrei o meu tesouro! Conheço a Linguagem do Mundo. Vou viver a minha Lenda Pessoal!
E, apagando para sempre a tristeza do seu destino, voltou para o canteiro de que antes não gostava.
Era o sinal do presente.
Havia que modificá-lo, para melhorar o futuro !
Devia Ser Feito.
Quando a Borboleta Azul foi-se afastando, ouviu a Flor que... semeava uma idéia no Filho Triste menor daquela Casa Triste.
“... Eu conheço um lugar bem distante e, ao mesmo tempo bem próximo.
Para entrar ali não há chaves.
Porque... não ha fechaduras. E não há fechaduras... porque também não existem portas...Você se despe antes, de todos...”
– Bud, explique-me porque a Flor não começou pelo Pai Triste ou pela Mãe Triste, isto é, pelos Adultos Tristes e... foi logo começar pelo Filho Triste menor?!
– Ah sim! É que... os adultos são os mais difíceis de aprender! Crianças e jovens... ensinam muito mais!
– Bonita história, Bud!
– Não é história. É... a maior das Verdades... vinda à baila... por intermédio de dois jovens e de um livro.
Bons jovens e bons livros trazem luz em verdades que dormem dentro de nós.

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