15 de agosto de 2009

O Consórcio

Postado por Agnaldo Vergara
Est texto foi publicado na Internete em dezembro de 2003

Acho que hoje vou falar de outra coisa. Nada de Lula, nem do Genoíno e nem da língua “plesa” do Palofi, que participa dessa dupla dinâmica Nada da Guerra do Iraque.
Acho que esse pessoal “todo” está com... certos conflitos...
Vou falar de irmã para irmão, como o é você, leitor e internauta.
Gostaria de lhes contar “um causo”. Acontecido. De verdade. Não é lorota, como as notícias que nos chegam do Oriente, em que cada parte fala a verdade que lhe serve. E falta comida e água para todos!
Você sabia que há três verdades no mundo, e que servem para cada um de nós, particularmente, também? Uma: como você a vê (ou se vê); duas: como ou outros a vêem (ou vêem você)... e três:
A VERDADE, tal como ela é!
Minha santa mãe (Deus a tem), faleceu em 1988. Em Nova Odessa, (fundada pelos Botelhos que, 65 anos, haviam fundado a minha cidade de hoje: São Carlos!) Eu não sabia sequer quanto custava um funeral.
Não! Funeral é de rico! Para nós e enterro mesmo!
Fui saber, em Americana... voltei, absolutamente assustada! Uma fortuna!!
Graças a Deus, havia um santo tio empresário, que pagou tudo.
Dei graças a Deus, também, quando pude comparecer à magnífica festa do último aniversário dele! festa promovida pela sua santa Irmã (uma entre a irmandade de doze!) Após missa solene, jantar delicioso... eu dancei com ele! Dancei com meu velho tio, freqüentador assíduo dos “Veteranos” de Americana.E foi... a sua última valsa!!
Confesso que, sempre otimista e bem-humorada, em vez de pensar em morte e seus custos, comecei a estudar “Medicina Alternativa”, de modo a prolongar a vida e dar tempo de, formados os filhos... juntar dinheiro!! Mas... minha inteligente irmã Nancy resolveu de outro modo. Discreta, como sempre, calou-se a respeito. Nisso, eu e minha santa irmã Nancy, somos muito diferentes.
Ela fala de menos; eu falo demais, extrovertidamente, e, quase sempre, levada por impulso emotivo momentâneo. Assim, quase nunca tenho razão!
Bem, aí faleceu o santo pai dela, meu santo padrasto Ricardo.
Eu quase não acreditei quando ela afirmou: “Já providenciei tudo.” Como “tudo”, pergunto.
“Reparti em vezes”, responde. “Tem certeza” pergunto. “Sim”.
Eu falo com ela duas ou três vezes por semana. Telefone. Ela não tem, ainda, computador.
Foi ontem que ela me ligou: “Alô”, diz ela; “Sim”, digo eu e... depois das convencionais frases do tipo: “É verdade que sua terceira dentição inferior está dando problemas, com tudo inchado”, pergunta. “E que problema! Está tudo balançando mais que a ponte Rio-Niterói, em tempestades!”, respondo eu. “Usa super-corega”! os irreverentes dentes postiços ficam todos, quietos e imóveis... por oito horas!”, diz. “NããOO!! Digo eu. “SIIIMM”, reitera ela. “Vou buscar” já reitero eu! Agora passo para o discurso direto:
– Mas, qual é a finalidade de seu telefonema, enfim?
– É que... que... é que... bem...
– Desembucha logo, pô!!
– Sim... sim... é que, depois da morte da mãe, eu fiz... um consórcio de defunto e...
– Você fez O QUÊ??
– Consórcio. Sabe, aquele tipo de contrato que a gente vai pagando cada mês o produto que compra... (ela se dispôs, então, a explicar-me tudo com detalhes), que eu não ouvia! porque, estupefata, do outro lado do fio, imaginava, calada... acho que foi a única vez em que só ela falou e eu... só ouvi...
– Você está ainda aí?
– Lógico! E sei, muito bem, como funciona um consórcio!! Só que me perguntava se foi esse o motivo de você pagar, sozinha, o enterro do nosso pai...
– Justamente.
– Então não estou entendendo mais nada!
– É que... o consórcio que eu fiz, desde 1988, é para dez defuntos.
– QUANTOS defuntos??!!
– Dez. E... durante todos esses anos... você foi pagando?? Pelas flautas do Anjo Gabriel e, ONDE, criatura, você botou todos esses dez caixões... ? Não os teria, por mero acaso, uns sobre os outros, “acomodado” na garagem da antiga casa da nossa mãe... ou na Fazenda Flórida, dos Vaughans, em Sumaré... teria... ?!!
– Não. Mas...
– UM MOMENTO!! (digo eu, autoritária) Tenho mais uma... perguntinha: como escolheu o tamanho dos caixões? Sei que você, inteligente como o é, deveria ter escolhido um cumprimento de caixão de, no mínimo dois metros, porque assim, numa altura média de 1,80m, sobrariam dez centímetros nos pés e dez na cabeça. Para encher com muitas flores e, talvez, até um sanduichinho de atum. Sabe, no antigo Egito, muitos alimentos eram colocados...
– Nada disso. O caixão é de acordo com o tamanho específico do defunto e...
– Fico mais sossegada! detestaria ver um defunto nosso, no cemitério, ser espremido e comprimido num mini-caixão, com todo mundo sentando em cima, para poder fechar a... dita cuja da mala de... viagem... !
– Nada disso.
– Ótimo!! Então vamos começar tudo de novo: qual a razão de seu telefonema?
– É que já tenho nove... inscritos. Gostaria de saber se você... não estaria interessada em... em... em...
– Ah bom!! Já entendi! Você já tem nove defuntos e está à cata do décimo. E quer que eu seja suplente à essa vaga, antes que algum mais próximo candidato à defunto, lance mão dela? “Isso”, me responde ela. “O que me será oferecido”, pergunto eu.
– Tudo de primeira, confortável, acolchoamento lateral soft, espelhinho na tampa, NÃO!!... no... teto... travesseiro...
– Quero dois! vou levar minha língua junto, pô!!
– Travesseiros... perfumados, com o “Heure Intime”, de que tanto você gosta. Aí pergunto eu: “Heure Intime do Paraguai ou... de France? “De France”, responde ela.
– Aceito!! Agora, minha santa irmã Nancy, vai me desculpar pelo excessivo tempo desta ligação? Eu sempre falo muito!!
– Não há problema, eu fiz... a cobrar, não se lembra?
– Olhe, vai pro inferno!!
– Muito improvável! Depois que você chegar lá... não vai mais haver vaga pra ninguém!!!

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